Thursday, May 30, 2013

E os americanos “vigiavam” Cunhal (reeditado)


São dezenas de telegramas: sempre que Cunhal dá uma entrevista, seja em França, Brasil, Checoslováquia, havia uma embaixada ou consulado norte-americano a fazer um telegrama.
Um mês antes do 11 de Março, tentativa “putchista” de Spínola e seus apoiantes, Cunhal alertava para os riscos de golpe num país em que “rumores de golpe” andavam de boca em boca, de manchete em manchete.
Veja-se este telegrama, do embaixador norte-americano em Lisboa Frank Carlucci, sobre uma entrevista do líder comunista à revista brasileiro “Veja”: Cunhal, segundo Carlucci, falava em risco de golpe da direita, e de guerra civil, para tentar “arrefecer” os rumores de que o PCP estaria a preparar a tomada do poder.
(Ler o telegrama na íntegra aqui)

CONFIDENTIAL
PAGE 01 LISBON 00880 141927Z
20
ACTION EUR-12
INFO OCT-01 AF-06 ARA-06 ISO-00 CIAE-00 DODE-00 PM-03 H-01
INR-07 L-02 NSAE-00 NSC-05 PA-01 PRS-01 SP-02 SS-15
USIA-06 ACDA-05 SAJ-01 /074 W
--------------------- 039717
R 141635Z FEB 75
FM AMEMBASSY LISBON
TO SECSTATE WASHDC 1755
INFO AMEMBASSY BONN
AMEMBASSY BRASILIA
AMEMBASSY LONDON
AMCONSUL LOURENCO MARQUES
AMCONSUL LUANDA
AMEMBASSY MADRID
AMEMBASSY PARIS
AMCONSUL RIO DE JANEIRO
USMISSION NATO
DIA WASHDC
USCINCEUR VAIHINGEN GER
AMCONSUL OPORTO
AMCONSUL PONTA DELGADA
C O N F I D E N T I A L LISBON 880
EO 11652: GDS
TAGS: PINT, PO
SUBJ: ALVARO CUNHAL ON "LOCKED GATE" AND POSSIBILITY OF CIVIL WAR
1. SECRETARY GENERAL OF PORTUGUESE COMMUNIST PARTY (PCP)
ALVARO CUNHAL GRANTED INTERVIEW TO BRAZILIAN MAGAZINE "VEJA"
IN WHICH HE STATED THAT THERE WAS NOTHING EXTRAORDINARY ABOUT
NATO "LOCKED GATE" EXERCISE SINCE PORTUGAL IS MEMBR OF NATO.
CUNHAL WENT ON TO STATE THAT TIMING OF EXERCISE POORLY CHOSEN,
BUT IT NOT NECESSARY TO "DRAMATIZE" THAT FACT.
2. REGARDING POSSIBILITY OF CIVIL WAR IN PORTUGAL, CUNHAL
STATED THAT CIVIL WAR NOT LIKELY, BUT THAT IT COULD ARISE IF
CONFIDENTIAL

CONFIDENTIAL
PAGE 02 LISBON 00880 141927Z
"COUNTE-REVOLUTIONARY FORCES" MADE ARMED COUP ATTEMPT.
3. COMMENT: IT APPARENT THAT CUNHAL IS MAKING ATTEMPT IN
"VEJA" INTERVIEW TO COOL ALARMIST RUMORS CONNECTED WITH RECENT
ISSUES SUCH AS "LOCKED GATE" AND DRAFT LABOR LAW, ESPECIALLY
REGARDING PCP ATTEMPTS TO TAKE OVER GOVT.
STATEMENTS MADE IN "VEJA" SIMILAR TO PREVIOUS STATEMENTS MADE
BY CUNHAL ON THESE TOPICS.
CARLUCCI
CONFIDENTIAL
NNNN

Cunhal nos arquivos norte-americanos (reeditado)


Este é um excerto de um telegrama enviado pelo Departamento de Estado (não citado no meu livro) em que o embaixador João Hall Themido, diploma português em Washington que resistiu ao 25 de Abril e ficou em funções, apesar da queda da ditadura. Ele foi uma “peça”, pela continuidade, na tentativa de acalmar o aliado americano face às mudanças de regime em Portugal. A 30 de Maio de 1974, Themido estivera em Lisboa e regressou a Washington com uma mensagem de amizade aos Estados Unidos, nessa altura ainda na fase de “wait and see”, mas já com os olhos postos em Álvaro Cunhal , líder do “único partido organizado”, como não se cansava de dizer Kissinger. Conciliador, João Hall Themido dizer que, até ao momento, fizera declarações muito “responsáveis”. Nos meses, anos seguintes o embaixador teve posições bem mais alarmadas sobre "os comunistas" em Portugal...
(Telegrama retirado dos National Archives)
Ver o telegrama na íntegra aqui


CONFIDENTIAL
PAGE 01 STATE 113385
63
ORIGIN EUR-25
INFO OCT-01 ISO-00 CIAE-00 DODE-00 PM-07 H-03 INR-10 L-03
NSAE-00 NSC-07 PA-04 RSC-01 PRS-01 SP-03 SS-20
USIA-15 IO-14 AF-10 SAM-01 EB-11 /136 R
DRAFTED BY EUR/IB:WPKELLY:MS
APPROVED BY EUR - WELLS STABLER
--------------------- 091061
P 301929Z MAY 74
FM SECSTATE WASHDC
TO AMEMBASSY LISBON PRIORITY
C O N F I D E N T I A L STATE 113385
E.O. 11652: GDS
TAGS: PFOR, PO, U-S.
SUBJECT: CONVERSATION WITH PORTUGUESE AMBASSADOR TO U.S.
1. AMBASSADOR THEMIDO (JUST RETURNED FROM CONSULTATION IN
LISBON) CALLED ON ACTING ASSISTANT SECRETARY STABLER LATE
AFTERNOON MAY 28 TO DELIVER LETTER FROM FOREIGN MINISTER
SOARES TO SECRETARY THANKING HIM FOR HIS MESSAGE AND TO
CONVEY--UNDER INSTRUCTIONS--SOARES' STRONGLY EXPRESSED
DESIRE FOR STRENGTHENED PORTUGUESE RELATIONS WITH U.S.
COPY OF LETTER BEING POUCHED FOR POST INFO. MAJOR
ELEMENTS OF CONVERSATION ARE SUMMARIZED BELOW.
(...)
5. STABLER ASKED HOW THE PROVISIONAL GOVERNMENT OPERATES
VIS-A-VIS THE JUNTA. THEMIDO REPLIED THAT THE PG
IMPLEMENTS THE PROGRAM DEFINED BY THE JUNTA AND THE ARMED
FORCES MOVEMENT BUT THAT THE JUNTA CONCERNS ITSELF
PRINCIPALLY WITH BROAD GUIDELINES FOR SOLVING THE MAJOR
ECONOMIC AND POLITICAL PROBLEMS OF THE COUNTRY, E.G.
LABOR DIFFICULTIES AND THE OVERSEAS TERRITORIES. THEMIDO
EXPLAINED WHY COMMUNISTS ARE INCLUDED IN THE PROVISIONAL
GOVERNMENT, VOLUNTEERED HIS PERSONAL OPINION THAT CUNHAL
HAS BEEN "RESPONSIBLE" THUS FAR IN THE STATEMENTS HE
HAS MADE, AND SAID THAT ELECTIONS WILL CLEARLY SHOW WHERE
PORTUGAL IS GOING POLITICALLY (WHICH THEMIDO SEEMED TO
THINK WAS TOWARD THE CENTER).

Duas semanas antes, a embaixada norte-americana em Lisboa apresentava, em cinco linhas, Cunhal, então nomeado ministro sem pasta no Governo Provisório, como um comunista, “duro” e “disciplinado”, actualmente líder do PCP, e que nos últimos 14 anos viveu em Praga.
Ver o telegrama na íntegra aqui


CONFIDENTIAL
PAGE 01 LISBON 01949 01 OF 02 161602Z
43
ACTION EUR-25
INFO OCT-01 AF-10 ARA-16 NEA-14 ISO-00 EURE-00 SSO-00
NSCE-00 USIE-00 INRE-00 CIAE-00 PM-07 H-03 INR-10
L-03 NSAE-00 NSC-07 PA-04 RSC-01 PRS-01 SP-03 SS-20
SAM-01 OMB-01 NIC-01 SAJ-01 SSC-01 DRC-01 /131 W
--------------------- 044774
O R 161500Z MAY 74
FM AMEMBASSY LISBON
TO SECSTATE WASHDC IMMEDIATE 9610
INFO Z/AMEMBASSY BRASILIA 152
AMEMBASSY CONAKRY
AMEMBASSY DAKAR
AMCONSUL LOURENCO MARQUES
AMCONSUL LUANDA
AMEMBASSY LUSAKA
AMEMBASSY MADRID
AMCONSUL OPORTO UNN
AMCONSUL PONTA DELGADA UNN
AMEMBASSY RABAT
AMEMBASSY PRETORIA
USCINCEUR
CINCLANT
DIA
COMUSFORAZ
USMISSION NATO
C O N F I D E N T I A L SECTION 1 OF 2 LISBON 1949
E.O. 11652: GDS
TAGS: PINT, PGOV, PO
SUBJ: PROVISIONAL GOVERNMENT NAMED

(…)
3. MINISTER WITHOUT PORTFOLIO ALVARO CUNHAL, 50, IS A TOUGH,
DISCIPLINED LIFE-LONG COMMUNIST PRESENTLY SERVING
AS PCP SECRETARY GENERAL. FOR PAST FOURTEEN YEARS
HE HAS LIVED IN PRAGUE. HE HAS SPENT TWELVE YEARS IN
PORTUGUESE PRISONS.

Monday, May 20, 2013

Cunhal


Em breve, Álvaro Cunhal nos arquivos norte-americanos.
(A foto é do Alfredo Cunha)

Saturday, May 11, 2013

Até os telefones dos americanos falharam...




http://www.tvi24.iol.pt/503/politica/25-abril-revolucao-golpe-eua-telefones-tvi24/1442997-4072.html

25 de Abril: o dia em que os telefones americanos falharam

Embaixada dos EUA não percebeu logo o que se estava a passar com o golpe, com o obstáculo adicional das comunicações para Washington não funcionarem

Por: tvi24 / AR    |   2013-04-25 08:00
A Embaixada dos EUA teve dificuldades em perceber o que se estava a passar com o golpe de 25 de abril de 1974 em Portugal e teve um obstáculo adicional: os telefones não funcionaram de Lisboa para Washington.

De acordo com a Lusa, das comunicações entre a representação diplomática norte-americana em Lisboa e o Departamento de Estado, depositadas nos Arquivos Nacionais dos Estados Unidos, percebe-se a cautela com que a diplomacia encarou o golpe de Estado do Movimento das Forças Armadas (MFA). Mas fica, também, um registo insólito: os telefones falharam no dia em que caiu a ditadura em Portugal, precisamente ao fim da tarde, à hora a que o chefe do Governo, Marcelo Caetano, se rendeu no Largo do Carmo, em Lisboa, entre as 18:00 e as 19:00.

Falhadas as ligações telefónicas, restavam o telégrafo e os telegramas. Desde Lisboa, os diplomatas enviaram pelo menos dois telegramas, pedindo que lhes telefonassem «imediatamente» desde Washington. E até davam os números da embaixada (555141 ou 555149).

Logo pela manhã, quando o desfecho do golpe era desconhecido, o registo dos diplomatas norte-americanos em Lisboa, mas também nos Açores, onde dos EUA têm uma base, nas Lajes, era cauteloso.

«Está tudo tranquilo», lia-se num telegrama do Consulado em Ponta Delgada enviado para Washington às primeiras horas do dia em que o Movimento das Forças Armadas derrubou a ditadura, e que está depositado nos Arquivos Nacionais .

De Lisboa, o primeiro telegrama, com o mesmo título, «Distúrbios em Portugal», surge pelas 09:50. A mensagem fazia uma mera descrição do que estava a passar-se: tanques nas ruas de Lisboa, sedes de ministérios cercadas pelos militares, o relato dos apelos à calma, feitos pelo MFA através da rádio.

De acordo com vários ensaios históricos, a diplomacia norte-americana desconhecia, em profundidade, as movimentações dos militares para derrubar o Governo de Caetano e pôr fim à guerra colonial em África, fazer eleições livres e democratizar o país.

Os analistas norte-americanos chegaram a atribuir o golpe de Estado a militares ligados ao general António de Spínola e não ao Movimento das Forças Armadas (MFA). Pelo que os primeiros telegramas são vagos quanto à autoria do golpe.

Às 14:37, a preocupação da representação diplomática era comunicar a Washington que não havia motivos para crer que o golpe iria colocar em perigo «vidas e propriedades» de norte-americanos em Portugal.

Ainda assim, a embaixada estava a aconselhar os turistas norte-americanos em Lisboa a permanecerem nos hotéis «até que a situação se clarifique».

No final do dia do golpe, e numa altura em que Caetano já se rendera ao MFA, o Departamento de Estado dos EUA enviou então às representações a primeira posição formal de Washington quanto ao golpe, instruindo os embaixadores sobre o que poderiam dizer.

E o que poderiam dizer era muito pouco: a embaixada em Lisboa estava a acompanhar a situação, os turistas norte-americanos foram aconselhados a não ir para as ruas e que a base das Lajes, nos Açores, não fora afetada.

Num mundo ainda dividido em dois blocos, Estados Unidos e União Soviética, e a viver uma Guerra Fria, a diplomacia norte-americana, apesar das dúvidas iniciais, apoiou depois ativamente o PS de Mário Soares e o grupo dos «moderados» dentro do MFA, contra a ala esquerdista e o PCP de Álvaro Cunhal.

O secretário de Estado dos EUA, Henry Kissinger, chegou a dar Portugal como um caso perdido para os comunistas, em 1975. Mas depois Kissinger acabou por apoiar os «moderados» e contribuir ativamente para a queda do Governo de Vasco Gonçalves, apoiado pelo PCP.