Wednesday, December 03, 2014

EUA/Portugal: Kissinger queria golpe de estado de direita em 1975




EUA/Portugal: Kissinger queria golpe de estado de direita em 1975

O ex-secretário de Estado norte-americano Henry Kissinger não era assim “tão contra” um golpe de estado de direita em Portugal durante o processo revolucionário de 1975 e admitiu fornecer armas ao “grupo dos Nove”.
Estas são revelações feitas, 40 anos após o 25 de Abril de 1974, em documentos do Departamento de Estado até agora considerados “secretos” e publicados no volume do departamento histórico do Departamento de Estado sobre a política externa norte-americana, referente aos anos de 1969-1977 (Foreign Relations of the United States – Volume E-15, part II).
A reunião decorreu a 12 de agosto de 1975, entre Kissinger, o embaixador dos EUA em Lisboa, Frank Carlucci, e vários membros do Departamento de Estado, em Washington, incluindo William Hyland, diretor do Departamento de Informações e Pesquisa do Departamento de Estado.
Já passara mais de um ano sobre o golpe que derrubou a ditadura, a 25 de Abril, e o Governo de Lisboa era liderado por Vasco Gonçalves, o “inimigo número um” dos EUA. Carlucci e Hyland concluíram que o maior risco para os objetivos norte-americanos eram António de Spínola, o primeiro presidente pós-25 de Abril e que liderou o 11 de março, e a extrema-direita.
Nessa altura, Henry Kissinger, chefe da diplomacia dos presidentes Richard Nixon e Gerald Ford, disse algo que, admitiu, poderia chocar os seus “colegas”.
“Não sou assim tão contra um golpe desse tipo [de direita], por muito chocante que seja para os meus colegas…”, lê-se na ata da reunião de agosto de 1975, em que se discutiram as hipóteses de êxito de um golpe por parte da direita em Portugal.
Carlucci opôs-se, tal como já se opusera à tese da vacina: Kissinger aceitaria “perder” Portugal para os comunistas, apoiados pela União Soviética, e tal funcionaria como “vacina” para Espanha ou Itália. O diplomata defendeu, isso sim, o apoio dos EUA aos “moderados”, incluindo o PS de Mário Soares.
“Não, também não sou contra um golpe, se resultasse. Mas se Spínola o tentar, não vai resultar. [Melo] Antunes [do Grupo dos Nove] pode ser um líder no momento seguinte, Spínola não. Ele é, na minha opinião, um homem muito perigoso”, afirmou Carlucci.
Spínola, durante o seu exílio após a tentativa falhada de golpe do 11 de março de 1975, fundou o Movimento Democrático de Libertação de Portugal (MDLP), tentou apoios em França e no Brasil para um movimento militar e popular que derrubasse o Governo liderado por Vasco Gonçalves e apoiado pelo PCP.
Kissinger disse que, naquela altura, os EUA não tinham qualquer relação com Spínola. Carlucci duvidou, dado que lera um relatório da CIA sobre a América Latina e que indicava “algum tipo de contacto” com o general.
É também na reunião de 12 de agosto no Departamento de Estado, em Washington, que Kissinger e Carlucci falam abertamente de uma guerra civil em Portugal e da possibilidade de fornecer armas a personalidades relacionadas ou com Mário Soares ou do Grupo dos Nove.
Neste ambiente, político e militar, Carlucci recebeu luz verde para Washington examinar o pedido” de fornecimento de armas desde que fosse legítimo.
“E se, no seu julgamento, os pedidos forem feitos por elementos responsáveis”, explicou Henry Kissinger. E Carlucci revelou ter sido contacto por pessoas que não eram nem ligadas a Soares nem ao PS nem aos militares “moderados”.
Não há, nestes documentos desclassificados, elementos sobre se foram entregues armas pelos Estados Unidos e a quem.

(Texto publicado na Lusa, a 23 de agosto de 2014)

Saturday, November 29, 2014

EUA/Portgual: CIA abortou plano para apoiar Spínola no Verão Quente de 1975



EUA/Portugal: CIA abortou plano para apoiar Spínola no Verão Quente de 1975


Os Estados Unidos tiveram um plano para apoiar António de Spínola, do movimento anticomunista MDLP, durante o período revolucionário de 1975, mas foi “chumbado” pela CIA, que foi mantendo “algum tipo de contacto” com o general.
A revelação é feita em documentos do Departamento de Estado até agora considerados “secretos” e publicados no volume do departamento histórico do Departamento de Estado sobre a política externa norte-americana, referente aos anos de 1969-1977 (Foreign Relations of the United States – Volume E-15, part II).
O embaixador dos Estados Unidos em Lisboa, Frank Carlucci, era contra qualquer apoio norte-americano ao general do monóculo, que fugiu de Portugal após a tentativa falhada de golpe de Estado de 11 de março de 1975, e é isso mesmo que diz a Henry Kissinger numa reunião em Washington em 12 de agosto de 1975, no Departamento de Estado.
A secreta norte-americana não estaria, porém, inocente nos contactos com Spínola, dado que Carlucci recorda, nesse encontro, que viu um relatório da CIA que “indicava algum tipo de contacto”, o que o lhe causa “alguma preocupação”.
A avaliar pelos documentos agora divulgados pelo Departamento de Estado, passados os quase 40 anos de classificação, a proposta de apoio a Spínola circulou entre vários membros do Comité dos 40, um organismo chefiado por Kissinger para supervisionar operações clandestinas e que incluía os serviços secretos, a CIA, mas não avançou, de acordo com um documento secreto, datado de 30 de julho de 1975.
O documento teve a oposição do Departamento de Estado e da CIA, obtendo apenas o voto favorável do chefe de estado conjunto das forças armadas norte-americanas, general George Brown. Para o Departamento de Estado, Spínola “estava descreditado e [com ele] não há perspetivas de sucesso” para os objetivos dos EUA.
Durante o seu exílio após a tentativa falhada de golpe do 11 de março de 1975, António de Spínola fundou o Movimento Democrático de Libertação de Portugal (MDLP), tentou apoios em França e no Brasil para um movimento militar e popular para derrubar o Governo liderado por Vasco Gonçalves e apoiado pelo PCP. 

(Texto publicado na Lusa, a 23 de agosto de 2014)

Monday, November 17, 2014

EUA/Portugal: Norte-americanos aprovaram primeiro plano de operações clandestinas em 1974

EUA/Portugal: Norte-americanos aprovaram primeiro plano de operações clandestinas em 1974


O Departamento de Estado e os serviços secretos norte-americanos aprovaram o seu primeiro plano de operações clandestinas para Portugal a 27 de setembro de 1974, para “evitar a tomada do poder pelos comunistas”.
Esta é a primeira vez que, 40 anos depois da revolução portuguesa, o Departamento de Estado norte-americano revelou, ainda que parcialmente, documentos e parte dos debates “on the record” no Comité dos 40, organismo que supervisionava operações clandestinas e incluía os serviços secretos, a CIA.
Grande parte de nomes de personalidades políticas, partidos e organizações portuguesas envolvidas nas operações, que nunca são descritas ao pormenor, continuam a ser segredo por questões de segurança e foram apagados na versão agora “desclassificada”.
O lote de documentos é grande e foi publicado no volume do departamento histórico do Departamento de Estado sobre a política externa norte-americana, referente aos anos de 1969-1977 (Foreign Relations of the United States – Volume E-15, part II).
A primeira proposta de “operações políticas” do Comité dos 40 tem a data de 27 de setembro, um dia antes da frustrada manifestação da maioria silenciosa de 28 de setembro, inspirada por António de Spínola, primeiro presidente após o golpe do Movimento das Forças Armadas (MFA), e que antecipou a sua demissão, a 30 de setembro.
Esta proposta inicial incluía planos específicos, não revelados ainda hoje, para a campanha das primeiras eleições livres para a Assembleia Constituinte, mas também ações para influenciar os militares do MFA.
A demissão de Spínola, em que alertou para novas formas de totalitarismo, e o ascendente das forças de esquerda levou Kissinger a concluir que havia agora uma “coordenação estreita” entre o MFA e os comunistas.
Num memorando de outubro de 1974 destinado a Kissinger, fala-se em “fortalecer o PS” e em ajudar a “desenvolver um partido centrista que atuasse em coligação com os socialistas para derrotar o PCP”.
Mas é a 20 de janeiro de 1975 que a administração de Gerald Ford, numa reunião, decidiu avançar com um renovado plano de operações clandestinas para Portugal - “quer haja ou não fugas de informação”, nas palavras do presidente Gerald Ford.
Henry Kissinger chegou a defender que a CIA devia “infiltrar” o MFA e lembrou que ter defendido um “plano de ações clandestinas massivo” desde há meses.
Em março, um memorando de ações do Comité dos 40 foi chumbado pelo Departamento de Estado pelo risco de fugas de informação para os jornais.
Uma das ações passava por canalizar fundos para os partidos “não comunistas” portugueses por parte dos aliados europeus, incluindo verbas da CIA, mas também “expor as atividades subversivas” do PCP.
E é já depois das eleições para a Constituinte de 25 de abril de 1975, ganhas pelo PS e em que o PCP recolheu 12% dos votos, que o Comité dos 40 faz mais um documento a propor “proteger os ganhos dos moderados” nas eleições.

São recomendados mais apoios aos partidos, cooperação com “os europeus” para canalizar fundos para Portugal, influenciar o MFA a “tomar decisões democráticas”. A CIA sugeria que se organizasse uma “campanha mediática para mostrar a desaprovação internacional da eliminação dos processos democráticos”.

(Texto publicado na Lusa, a 23 de agosto de 2014)

Sunday, November 16, 2014

EUA/Portugal: Kissinger achava que comunistas iam matar Mário Soares em 1975

EUA/Portugal: Kissinger achava que comunistas iam matar Mário Soares em 1975

Henry Kissinger, ex-secretário de Estado norte-americano, previu e errou que “os comunistas” iam matar, em 1975, Mário Soares, líder histórico do PS e ministro dos Negócios Estrangeiros.
“Os comunistas vão arrastar Soares para a esquerda até ele perder apoio e depois vão matá-lo. As forças armadas vão fazer um golpe de estado sob liderança dos comunistas”, afirmou Kissinger numa reunião, a 04 de fevereiro de 1975, do Comité dos 40, organismo para supervisionar operações clandestinas e que incluía os serviços secretos, a CIA.
Henry Kissinger era um crítico de Mário Soares, considerando-o fraco e, em outubro de 1974, chegou a dizer-lhe que seria o “Kerensky português”, o dirigente socialista russo derrotado por Lenine na revolução russa de 1917.
Anos mais tarde, já depois do fim do período revolucionário, em finais de 1975, também numa reunião em Washington, admitiu o erro quanto a Mário Soares, que, na democracia portuguesa, foi primeiro-ministro de vários governos e Presidente da República (1986-1996).

Esta revelação é feita, 40 anos após o 25 de Abril de 1974, em documentos do Departamento de Estado até agora considerados “secretos” e publicados no volume do departamento histórico do Departamento de Estado sobre a política externa norte-americana, referente aos anos de 1969-1977 (Foreign Relations of the United States – Volume E-15, part II).

(Foto da Ford Library, com Costa Gomes e Geral Ford em primeiro plano, seguidos por Kissinger e Soares, em outubro de 1974)

(Texto publicado na Lusa, a 23 de agosto de 2014)