Sunday, June 29, 2008

Henry Kissinger: "Soares pertence à facção extremista?"

Tiago Moreira de Sá é historiador e ex-jornalista. Tem um livro “Os Americanos na Revolução Portuguesa” e está a preparar outro, igualmente sobre os Estados Unidos e Portugal durante o período revolucionário de 1974-75.
Na revista Atlântico de Maio publicou o texto “Os EUA e a ‘Revolução Spínolista’”, de que se publicam dois excertos retirado do blogue. Uma das melhores frases é mesmo a de Kissinger quando pergunta se Mário Soares é um extremista.

“A 25 de Abril de 1974, Henry Kissinger reúne com o staff do Departamento de Estado que dirigia. Um dos temas em cima da mesa é o golpe de Estado em Portugal, a chamada revolução dos cravos. Vale a pena transcrever parte do que foi dito sobre o nosso país, num diálogo inédito entre o todo-poderoso secretário de Estado norte-americano, Henry Kissinger, e o responsável máximo do Departamento de Estado para os Assuntos Europeus, Arthur Hartman.

Arthur Hartman: «Espero que não me negue a oportunidade de falar sobre um golpe de Estado na Europa. Não é todos os dias que tenho essa hipótese (risos). As últimas notícias são que [Marcello] Caetano foi preso – não há nenhuma palavra sobre o que aconteceu com [Américo] Tomás. Existe um relato de um funcionário da embaixada dizendo que Spínola estava a ir para o quartel-general nacional no meio da aclamação popular. De qualquer modo, ainda nada é absolutamente definitivo sobre que grupo tomou conta do poder e quais as suas políticas. Tanto quanto sei, não há relatos a partir das colónias sobre as actividades lá.»
Henry Kissinger: «Então, se se trata de Spínola a política nas colónias será mais liberal.»
AH: «Mais liberal. Existem algumas evidências de que têm existido grupos económicos a apoiar a posição [de Spínola].»
HK: «Mas eles têm que estar loucos para pensarem que podem aguentar as colónias através de meios mais liberais. Assim que entrarem por esse caminho vão perder as colónias.» (1)
(…)
“O mais condecorado herói de guerra”

O diálogo entre Henry Kissinger e Arthur Hartman constitui um resumo elucidativo da reacção inicial dos Estados Unidos ao 25 de Abril. Nele se percebe a surpresa com que o derrube do Estado Novo é recebido em Washington, assim como o quase total desconhecimento acerca do Movimento das Forças Armadas (MFA) – e, finalmente, a atribuição do golpe de Estado militar a António de Spínola.
Estas percepções são confirmadas pelos demais registos existentes nos arquivos norte-americanos, desde logo pela correspondência trocada entre a Embaixada em Lisboa e o Departamento de Estado.
No dia seguinte, ocorre mais uma reunião de Henry Kissinger com o seu staff do Departamento de Estado onde, entre outros assuntos, são analisadas as consequências da “crise Palma Carlos”:

Arthur Hartman: «A situação portuguesa está também a tornar-se mais confusa. Alguns ministros demitiram-se, incluindo o primeiro-ministro. Parece que as coisas estão a transformar-se numa luta entre o próprio Spínola, que quer ter mais poder e dar mais poder aos ministros civis e “centristas”, e os militares [do MFA] que o têm apoiado.»
Henry Kissinger: «A minha previsão tem sido sempre que só há dois desenvolvimentos possíveis. Ou os militares tomam conta do poder ou a esquerda fá-lo-á.»
AH: «Há uma complicação adicional pois existem alguns elementos de esquerda no grupo militar.»
HK: «Nós estamos fora disso?»
AH: «Tanto quanto sei.»
HK: «Bem, diz-lhes para ficarem fora disso. Sabemos o suficiente para ter uma perspectiva?»
AH: «Penso que não sabemos.»
HK: «Bem, desde que estejamos fora disso. Pessoalmente, prefiro que um grupo centrista domine a situação. Mas não vejo que tipo de apoio poderá ter.»
AH: «Claramente, terá que ter o apoio dos militares.»
HK: «Aparentemente, Soares continua no Governo.»
AH: «Sim.»
HK: «Ele pertence à facção extremista?»
AH: «Não. Mas está aparentemente à espera do seu momento, pois penso que esta é mais uma luta entre os dois ministros comunistas, um dos quais é o ministro do Trabalho, e os centristas.» (2)

(1) The Secretary´s Principals and Regionals Staff Meeting, Department of State, April 26, 1974, National Archives.
(2) The Secretary´s Principal´s and Regional´s Staff Meeting, July 10, 1974

Saturday, June 28, 2008

François Mitterrand, porta-voz das "dúvidas" soviéticas sobre Cunhal?


François Mitterrand era líder do PCF e da oposição em França quando foi a Moscovo, de 23 a 28 de Abril de 1975. No regresso, a embaixada norte-americana em Paris recolheu as opiniões de Mitterrand sobre a visita e o que pensava que os soviéticos pensavam da revolução portuguesa e dos seus "planos" para a Península Ibérica.
No telegrama enviado para o Departamento de Estado, em Washington, a embaixada emite também uma opinião ou “impressão” de Mitterrand sobre Álvaro Cunhal, secretário-geral do PCP e fiel aliado desde há décadas do partido irmão soviético, do “centro”. Seria mesmo? A avaliar pelos contactos na capital soviética, não. Melhor dizendo: a liderança soviética – o Kremlin ou o Partido Comunista da União Soviética (PCUS)? - tinha dúvidas ou fazia passar a ideia de que tinham dúvidas.
O telegrama tem como fontes “os mais directos colaboradores” daquele que viria a ser presidente de França e aliado de peso de Mário Soares nesses meses agitados. Mitterrand, segundo os seus colaboradores, “regressou de Moscovo convencido de que os soviéticos não têm uma estima muito grande pelo líder do Partido Comunista Português Cunhal, cuja inexperiência política e intransigência pessoal olham como uma força desestabilizadora na Europa”.
“Na ausência de melhor alternativa, Mitterrand espera que o PCUS continue a apoiar Cunhal, apesar de considerar altamente exageradas as notícias da imprensa sobre os fortes apoios financeiros dos soviéticos [ao PCP]. Na sua opinião, os soviéticos estão claramente mais interessados na estabilidade política da Europa Ocidental do que em ganhos nacionais”, pode ler-se no telegrama. Em Portugal, no caso.
Surpreendente ou talvez não. Esta visão, porém, não era consensual. Giscard d'Estaing, por exemplo, não tinha esta opinião tão "simpática" das intenções soviéticas. Bem pelo contrário.







Extracto do telegrama dos National Archives, que pode ser consultado aqui.






CONFIDENTIAL
PAGE 01



PARIS 11844 01 OF 02 092110Z
63
ACTION EUR-12
INFO OCT-01 ARA-06 IO-10 ISO-00 CIAE-00 DODE-00 PM-03 H-02
INR-07 L-02 NSAE-00 NSC-05 PA-01 PRS-01 SP-02 SS-15
USIA-06 OMB-01 SAJ-01 SAM-01 /076 W
--------------------- 083548
R 092057Z MAY 75
FM AMEMBASSY PARIS
TO SECSTATE WASHDC 9260
INFO AMEMBASSY BELGRADE
AMEMBASSY BERLIN
USMISSION USBERLIN
AMEMBASSY BONN
AMEMBASSY BUCHAREST
AMEMBASSY BUDAPEST
AMEMBASSY LISBON
AMEMBASSY LONDON
AMEMBASSY MOSCOW
AMEMBASSY PRAGUE
AMEMBASSY ROME
AMEMBASSY SOFIA
AMEMBASSY WARSAW
USMISSION GENEVA
USMISSION NATO
AMCONSUL BORDEAUX
AMCONSUL LYON
AMCONSUL MARSEILLE
AMCONSUL MARTINIQUE
AMCONSUL NICE
AMCONSUL STRASBOURG
C O N F I D E N T I A L SECTION 01 OF 02 PARIS 11844
GENEVA FOR USDEL CSCE
E.O. 11652: GDS
TAGS: PINT, FR, PFOR, UR

SUBJECT: PS/PCF RELATIONS AFTER MITTERRAND'S MOSCOW TRIP

SUMMARY AND CONCLUSIONS. IN THE AFTERMATH OF SOCIALIST
PARTY FIRST SECRETARY FRANCOIS MITTERRAND'S MOSCOW TRIP,
FRENCH SOCIALIST/COMMUNIST (PS/PCF) RELATIONS ARE
ENTERING A NEW PHASE. AFTER SOME SEVEN MONTHS OF PUBLIC
SQUABBLING, THE PS AND PCF HAVE COOLED THEIR POLEMIC
AND ARE MAKING SOME MOVES TOWARD GREATER DIALOGUE.
FOLLOWING HIS MOSCOW TRIP, MITTERRAND INVITED HIS PCF
PARTNERS IN THE UNITED LEFT TO A SUMMIT MEETING; ALTHOUGH
THE PCF HAS NOT OFFICIALLY AGREED, THE PARTY'S
CENTRAL COMMITTEE HAS INDICATED THAT IN PRINCIPLE IT IS
NOT OPPOSED.
WITH MITTERRAND RIDING HIGH ON WHAT THE PS PERCEIVES AS
THE INTERNATIONAL RECOGNITION BESTOWED ON IT BY THE
MOSCOW TRIP, WITH THE PS IN A STRONGER POSITION TO
ASSERT ITSELF WITHIN THE UNITED LEFT -- AS POLLS CONFIRM
THAT THE PCF HAS SLIPPED BADLY WHILE THE PS HAS MADE
MAJOR GAINS, THE PCF SEEMS TO HAVE OPTED AGAINST A
CONTINUATION OFITS PUBLICQUARREL WITH THE PS. THE
UNION OF THE LEFT'S DOMESTIC POLICY MAY TAKE A SLIGHT
TURN TO THE LEFT -- AS THE PRICE WHICH THE PS WILL HAVE
TO PAY IN ANY SUMMIT NEGOTIATION. HOWEVER, FOREIGN
POLICY DIFFERENCES BETWEEN THE PS AND PCF WILL REMAIN
AND COULD EVEN BECOME MORE PRONOUNCED OVER SUCH ISSUES
AS FRANCE'S NATO MEMBERSHIP, THE EC AND SALT/MBFR.
OVER THE NEAR TERM THIS UNEASY ALLIANCE WILL TAKE ON A
MORE CORDIAL TONE, BUT THE SUBSTANCE OF PS/PCF DIFFERENCES
REMAINS UNCHANGED.
WE DISCUSS BELOW ASPECTS OF MITTERRAND'S MOSCOW TRIP,
THE PS CONVENTION ON PS/PCF RELATIONS, AND RELATED
INTERNAL DEVELOPMENTS AFFECTING THE UNION OF THE LEFT.
END SUMMARY AND CONCLUSIONS.

1. MITTERRAND'S MOSCOW TRIP (APRIL 23-28): PORTUGAL.
MITTERRAND'S CLOSEST ASSOCIATES HAVE TOLD US THAT HE
RETURNED FROM MOSCOW CONVINCED THAT THE SOVIETS ARE
NOT STRONGLY ATTACHED TO PORTUGUESE COMMUNIST PARTY
LEADER CUNHAL, WHOSE LACK OF POLITICAL EXPERTISE AND
PERSONAL INTRANSIGENCE THEY VIEW AS A POLITICALLY
DESTABILIZING FORCE IN EUROPE. IN THE ABSENCE OF A
BETTER ALTERNATIVE, MITTERRAND EXPECTS THE CPSU TO
CONTINUE TO SUPPORT CUNHAL ALTHOUGH HE DISMISSES PRESS
REPORTS OF HEAVY SOVIET FINANCIAL SUPPORT FOR THE PCP
AS WILDLY EXAGGERATED. IN HIS VIEW, THE SOVIETS ARE
CLEARLY MORE INTERESTED IN WESTERN EUROPEAN POLITICAL
STABILITY THAN IN NATIONAL COMMUNIST GAINS.
(...)

Friday, June 27, 2008

Gierek e os avisos aos revolucionários portugueses


Edward Gierek (1913-2001) era primeiro secretário do partido comunista da Polónia e esteve em Portugal durante a revolução, no primeiro mês de 1975.
Em Lisboa, Gierek encontrou-se sucessivamente com Álvaro Cunhal, líder histórico do PCP, o primeiro-ministro, general Vasco Gonçalves, e outro general, Otelo Saraiva de Carvalho, comandante do COPCON.
Tad Szulk, num artigo publicado em 1976 (Tad Szulc, “Lisbon and Washington: Behind the Portuguese Revolution”, Foreign Policy 21 (Winter 1975-1976) descreve que o Edward Gierek aconselhou os portugueses a “avançarem mais devagar com a revolução”, advertindo para os riscos de tensão entre os Estados Unidos e a União Soviética poderia “causar danos à détente”.
Analistas da CIA também tinham essa tese - de que os soviéticos não estariam dispostos a trocar uma “aventura” vermelha em Lisboa pelo “status quo” com os norte-americanos.
A mesma análise era feita pelos social-democratas suecos de Olof Palme, em Junho de 1976. O embaixador norte-americano em Estocolmo aproveita um encontro com Palme para lhe pedir uma avaliação da situação portuguesa, dado que um colaborador do líder sueco, Pierre Schori, tinha regressado essa semana de Lisboa. Além disso, Palme tinha conversado com Gierek, o que o tinha “descansado” sobre a revolução portuguesa.
O líder comunista polaco garantira-lhe que nem os soviéticos nem outros dirigentes da Europa de Leste “não desejam, repito, não desejam ‘precipitar os acontecimentos’ em Portugal”. Segundo Gierek, Portugal estará “pronto para uma revolução burguesa, mas não ainda para [uma revolução] proletária”.
E faz uma apreciação do líder polaco sobre Cunhal, considerando-o “razoável”. Os dirigentes à volta de Cunhal “estiveram muito tempo presos” o que, segundo Gierek, os tornou “demasiado ‘linha dura’”.


Extracto do telegrama original, que pode ser consultado em nara.gov.


CONFIDENTIAL
PAGE 01 STOCKH 02982 191211Z 46
ACTION EUR-12
INFO OCT-01 ISO-00 SAM-01 SAJ-01 IO-10 CIAE-00 DODE-00
PM-03 H-02 INR-07 L-03 NSAE-00 NSC-05 PA-01 PRS-01
SP-02 SS-15 USIA-06 ACDA-05 EB-07 OMB-01 TRSE-00
AID-05 AF-06 NEA-10 /104 W
---------------------
097663
R 191100Z JUN 75
FM AMEMBASSY STOCKHOLM
TO SECSTATE WASHDC 4948
INFO AMEMBASSY COPENHAGEN
AMEMBASSY HELSINKI
AMEMBASSY LISBON
AMEMBASSY OSLO
AMEMBASSY REYKJAVIK
USMISSION USNATO
C O N F I D E N T I A L STOCKHOLM 2982
E.O. 11652: GDS
TAGS: PFOR, PO, SW

SUBJECT: SWEDISH PRIME MINISTER DISCUSSES PORTUGUESE SITUATION
1. WHILE CALLING ON PRIME MINISTER OLOF PALME PRIOR
TO HIS DEPARTURE JUNE 19 FOR OFFICIAL VISITS TO
MEXICO, VENEZUELA AND CUBA (SEPTEL), I ASKED HIM FOR
HIS ASSESSMENT OF THE CURRENT PORTUGESE SCENE. I
SAID I UNDERSTOOD THAT ONE OF HIS AIDES, PIERRE
SCHORI, HAD RETURNED ONLY THIS WEEK FROM A VISIT TO
THAT COUNTRY AND MIGHT HAVE SOME NEW INSIGHT INTO
THE SITUATION THERE.
(…)
3. THE PRIME MINISTER SAID THAT HE IS PLEASED WITH
THE POSITION OF THE USG AND THE EC-9 TOWARDS THE
PORTUGUESE GOVERNMENT. OUR ATTITUDE OF "WATCHFUL
WAITING," HE SAID, IS ALSO THE SWEDISH APPROACH.
PALME SAID HE IS WATCHING DEVELOPMENTS CLOSELY IN
PORTUGAL. HOWEVER, HE CONTINUED, HE FELT LESS WORRIED
SINCE HIS TALK WITH THE FIRST SECRETARY OF THE POLISH
COMMUNIST PARTY, EDWARD GIEREK, WHO VISITED SWEDEN
EARLY THIS MONTH (STOCKHOLM 2789). ACCORDING TO PALME,
HE AND GIEREK DISCUSSED PORTUGAL AT CONSIDERABLE
LENGTH. HE SAID GIEREK TOLD HIM THAT THE SOVIETS AND
OTHER EAST EUROPEANS DO NOT RPT NOT WISH TO
"PRECIPITATE EVENTS" IN PORTUGAL, AND THAT WHILE
PORTUGAL IS READY FOR A "BOURGOIS" REVOLUTION, IT IS
NOT READY YET FOR A "PROLETARIAN" ONE. GIEREK
DESCRIBED CUNHAL AS "REASONABLE," BUT ASSERTED THAT
SOME OF THE MEN AROUND HIM "HAD BEEN TOO LONG IN
JAIL," IMPLYING THAT THEIR TIME IN PRISON HAD MAKE
THEM TOO HARD-LINE.


Thursday, June 19, 2008

Alertas no NYT, cartazes nas paredes em Lisboa




A 30 de Setembro de 1974, dois dias depois do 28 de Setembro e da falhada manifestação da "maioria silenciosa", Spínola demite-se no meio de grande confusão e palavras duras e sombrias sobre o futuro do país, em que alertou para novas ditaduras, agora de sinal contrário, de esquerda.

Nos Estados Unidos, a demissão de Spínola é um dos primeiros alertas sobre a revolução dos cravos. O jornal "The New York Times" titula que as forças armadas portuguesas estão em alerta máximo para responder a um eventual golpe... Leia-se a notícia, retirada do Arquivo Pintasilgo, assim descrita:

"UNEASY PORTUGAL ON VIGIL FOR COUP : Armed Forces Alerted as a Precation in Wake of Spinola Resignation"
Autor: Henry Giniger
Âmbito e Conteúdo: Artigo, publicado no jornal «The New York Times», sobre o estado de alerta em que se encontravam as Forças Armadas portuguesas na sequência da resignação de António de Spínola do cargo de presidente da República, destacando a tensão política que se vivia em Portugal.

Data: [Out.1974]

Local: [Nova Iorque]


Enfim, todos tiveram de esperar cinco meses, até ao 11 de Março de 1975...

Post Scriptum: Vale a pena uma visita ao site do Arquivo Lourdes Pintasilgo -

Tuesday, June 17, 2008

Os desabafos de Kissinger na Cimeira de Helsínquia, em 1975


É uma imagem clássica da Cimeira de Helsínquia, em 1975. Uma reunião, no auge do Verão Quente da revolução, em que Portugal está no centro das atenções dos líderes mundiais. Brejnev foi confrontado sobre os apoios da URSS aos comunistas portugueses e disse que, no regresso a Moscovo, ia pensar no assunto.
À margem da cimeira, Gerald Ford e Henry Kissinger tiveram encontros com líderes europeus, entre eles o primeiro-ministro grego. Portugal voltou a ser tema de conversa e Kissinger lá desabafa que os Estados Unidos tinham "perdido um ano" por culpa dos europeus que lhe diziam que “não havia problema”. Caramanlis está céptico e diz que Portugal “não tem solução”.

Extracto do memorando, em inglês.

Memorandum of Conversation1
Helsinki, July 30, 1975, 1 p.m.
PARTICIPANTS
Greece:
Prime Minister Caramanlis
Foreign Minister Bitsios
Chef de Cabinet Molyviatos
U.S.:
The President
The Secretary of State
Mr. Arthur A. Hartman, Assistant Secretary for European Affairs
There was a brief discussion in the garden of the President’s previous
stops and then of his future travel plans including his plans to
meet with the Japanese Prime Minister.
(…)
The President: What do you think of Portugal today?
Caramanlis: I think it is hopeless.
The Secretary: That is my view.
The President: Do you think that they should stay in NATO if they
are Communists?
Caramanlis: There may be a civil war there. It depends on the
conservatives.
Bitsios: It is also bad for Spain.
The President: I noted that the Workers’ Associations in Spain have
voted and they have chosen either liberal or Communist leadership.
The Secretary: Yes.
Caramanlis: The Portuguese situation has a dangerous effect in
Spain and Italy. In my view when situations develop that are bad they
need immediate measures to correct them.
The Secretary: You’re right. We have wasted a year on Portugal
mainly because the West Europeans said there was no problem.
Caramanlis: In the case of Portugal, Cyprus and Arab oil, we
now have a big problem which creates hostility but if these crises
are dealt with quickly they usually can be solved and we can avoid
confrontation.


1 Ford Library, National Security Adviser, Memoranda of Conversations,
Box 14, CSCE, 7/26–8/4/75. Secret; Nodis. Drafted by Hartman. The meeting was held
at the Ambassador’s residence. Ford and Kissinger were in Helsinki for CSCE talks.
In "Foreign Relations of the United States, 1969–1976 - Greece; Cyprus; Turkey,
1973–1976 (Volume XXX)", Ed. Laurie Van Hook

[Foto: Soviet leader Leonid Brezhnev in expressive mood between his U.S. counterpart Gerald Ford (left) and the Soviet Foreign Minister Andrei Gromyko (right). Photo:VESA KLEMETTI]

Tuesday, June 10, 2008

Cunhal e a "táctica mais perigosa" para os Estados Unidos em 74





Era o primeiro congresso do PCP na legalidade após o 25 de Abril, mas só se realizou em Outubro, seis meses passados sobre o golpe dos “capitães”.
Da embaixada dos Estados Unidos em Lisboa, o congresso é acompanhado com interesse. No telegrama, com a data de 24 de Outubro, o embaixador Stuart Nash Scott conclui que “a táctica” adoptada pelo PCP liderado por Cunhal é aquela que, “quanto aos interesses, a longo prazo, dos EUA”, é “provavelmente a mais perigosa que o PCP poderia seguir” - ou seja, credibilizar-se com um discurso para conseguir "respeitabilidade e legitimidade".
De resto, ao longo das suas seis páginas, o telegrama faz a descrição dos trabalhos do congresso dos comunistas, incluindo a decisão de retirar a expressão “ditadura do proletariado” das suas teses e o programa de emergência que, para o diplomata, mais não era do que “uma versão portuguesa” da “Nova Política Económica”, adoptada por Lenine, em 1921. Neste “post”, é apresentado o “sumário” do telegrama e o último ponto, o décimo, aquele em que Scott faz uma apreciação sobre o congresso.


PAGE 01 LISBON 04611 01 OF 02 241316Z
43
ACTION EUR-12
INFO OCT-01 AF-04 ISO-00 IO-04 CIAE-00 PM-03 H-01 INR-05
L-01 NSAE-00 NSC-05 PA-01 RSC-01 PRS-01 SP-02 SS-15
USIA-06 SAM-01 EB-04 COME-00 TRSE-00 AGR-05 CIEP-01
SIL-01 LAB-01 NIC-01 /076 W
--------------------- 106059
R 241209Z OCT 74
FM AMEMBASSY LISBON
TO SECSTATE WASHDC 0843
INFO AMEMBASSY BONN
AMEMBASSY PARIS
AMEMBASSY MADRID
AMCONSUL LOURENCO MARQUES
AMCONSUL LUANDA
USMISSION NATO
USCINCEUR
DIA
AMCONSUL OPORTO
AMCONSUL PONTA DELGADA
LIMITED OFFICIAL USE SECTION 1 OF 2 LISBON 4611
E.O. 11652: N/A
TAGS: PINT PO
SUBJ: SPECIAL PCP CONGRESS APPROVES "EMERGENCY PLATFORM"
REF: FBIS LONDON A) 210009Z; B) 210330Z; C) 210402Z
D) 210222Z
SUMMARY: SPECIAL CONGRESS OF PORTUGUESE COMMUNIST PARTY
(PCP) HAS APPROVED "EMERGENCY PROGRAM" ADVOCATING DEFENSE
OF LIBERTIES AND REINFORCEMENT OF PORTUGUESE DEMOCRACY,
CONTINUATION OF DECOLONIZATION AND, IN EFFECT, ADVANCEMENT
OF A PORTUGUESE VERSION OF LENIN'S "NEW ECONOMIC POLICY" OF 1921.
PCP SECRETARY GENERAL CUNHAL SPOKE OF IMPEDIMENT THAT GENERAL
SPINOLA REPRESENTED FOR DEVELOPMENT OF PORTUGUESE DEMOCRACY. CUNHAL
ALSO DWELT AT LENGTH ON PROGRAM'S EXPURGATION OF SLOGAN
"DICTATORSHIP OF THE PROLETARIAT" FROM THE CONVENTIONAL
LITANY, SINCE IT CAN BE TOO EASILY MISCONSTRUED FOLLOWING
YEARS OF DICTATORSHIP FROM A DIFFERENT QUARTER. CUNHAL
WARNED THAT THERE COULD BE NO BARRIERS WITHIN THE PARTY
LEADERSHIP BETWEEN PRE-APRIL 25 (CLANDESTINE) MILITANTS
AND THOSE WHO HAVE EMERGED SINCE. STATISTICS WERE ISSUED
ON COMPOSITION OF CONGRESS DELEGATES AND PARTY MEMBERSHIP, AND
FULL COMPOSITION OF CENTRAL COMMITTEE WAS REVEALED FOR FIRST TIME.
LISBON PRESS ACCOUNTS SUGGEST THAT MANY CONGRESS DELEGATES
WERE UNHAPPY WITH THE BANNING OF SLOGAN ON DICTATORSHIP
OF PROLETARIAT. DOSCINTENT WITHIN RANKS MAY ALSO STEM
FROM EMERGENCY PROGRAM'S EMPHASIS ON STRENGTHENING NATIONAL
ECONOMY AND ACHIEVING SOCIAL AND ECONOMIC REFORM, RATHER
THAN DENUNCIATION OF SOCIAL EVILS AND INEQUALITIES
INHERITED FROM THE DISCRETIED PAST. END SUMMARY.
(…)
10. THE PARTY IS FOLLOWING A CLEVER LINE DESIGNED TO ENSURE ITS
ACHIEVEMENT OF LEGITIMACY AND RESPECTABILITY IN NEW PORTUGAL.
AS FAR AS LONG-RUN US INTERESTS ARE CONCERNED, THIS IS
PROBABLY THE MOST DANGEROUS TACTIC THE PCP COULD UNDERTAKE.
SCOTT


A versão integral do telegrama pode ser lida aqui, retirada dos National Archives.



Da página do PCP na Internet (http://www.pcp.pt/) retirei o resumo sobre o congresso:

A 20 de Outubro de 1974, poucos meses depois do 25 de Abril, reúne-se extraordinariamente o primeiro Congresso do PCP na legalidade, após 48 anos de fascismo. Com milhares de convidados em festa, milhares de delegados representando um Partido em forte crescimento aprovam modificações ao Programa e aos Estatutos, decorrentes da situação de liberdade conquistada. Aprova também, este VII Congresso, uma Plataforma de Emergência contendo medidas fundamentais para a defesa e desenvolvimento da Revolução. O Comité Central, apresentado ao Congresso, era então composto por 23 membros efectivos e 13 suplentes.