Espanha admitiu declarar guerra a Portugal depois do 25 de Abril
SUSETE FRANCISCO
Verão Quente. Transcrição de conversas com diplomatas americanos revela ameaça
O último líder do governo de Franco, Carlos Arias Navarro, admitiu entrar em guerra com Portugal, em 1975, para travar o avanço do comunismo. A revelação consta de documentos, ontem divulgados pelo jornal El País, nos quais são relatadas conversas entre o chefe do governo franquista e diplomatas norte-americanos. Os relatórios integram os Arquivos Nacionais, em Washington. É a primeira vez que a hipótese de um ataque de Espanha a Portugal, na sequência da revolução de 74, surge citada num documento.De acordo com o diário espanhol, Carlos Arias Navarro informou em privado os Estados Unidos de que Espanha estava disposta a avançar para uma guerra. Segundo o relato escrito pelos diplomatas norte-americanos, o líder do governo de Franco manifestava uma "profunda preocupação" com os acontecimentos em Portugal, e pretendia que os EUA garantissem o apoio a Madrid em caso de conflito armado na Península.Estava-se então em Março de 1975, já após a tentativa do golpe spinolista do 11 de Março em Portugal - ao qual Arias se terá referido como o "último acto insensato de Spínola". Neste mesmo mês, a evolução política portuguesa foi discutida num encontro entre Arias e Robert Ingersoll (à data vice-secretário de Estado norte-americano) que decorreu em Jerusalém. Num relatório deste encontro dirigido ao secretário de Estado Henry Kissinger, Ingersoll escreve que "Portugal é uma séria ameaça a Espanha, não só pelo desenvolvimento da situação [política], mas sobretudo pelo apoio exterior que poderia obter e que seria hostil a Espanha". Afirmando que Arias estava "profundamente inquieto" com o que se passava, Ingersoll traduz assim o pensamento do político espanhol: "Espanha estaria disposta a travar o combate anticomunista sozinha, se necessário. É um país forte e próspero. Não quer pedir ajuda. Mas confia que terá a cooperação e a comprensão dos seus amigos, não só no interesse de Espanha, mas de todos os que pensam da mesma forma."No mesmo encontro, Arias garantiu ter tomado as "precauções apropriadas" para impedir que o que se passava em Portugal se estendesse ao outro lado da fronteira. Um mês depois, já num encontro com o senador Hugh Scott, o chefe do governo espanhol voltava a afastar esse cenário, argumentando que Espanha tinha mais liberdade, mais crescimento económico e que as forças armadas não tinham sofrido a "tensão de uma guerra colonial". A 28 de Maio é a vez do embaixador Wells Stabler informar: "Com a larga fronteira com Portugal, seria difícil a Espanha proteger-se de uma acção subversiva portuguesa." As conversas entre Carlos Arias Navarro e os responsáveis norte- -americanos decorrem num contexto de tensão nas relações entre os dois países - os Estados Unidos queriam renegociar a continuidade de várias bases militares em território espanhol, enquanto a Espanha de Franco procurava apoio internacional para entrar na NATO. É neste âmbito que Arias se queixa dos países europeus, apontando a incongruência da sua atitude face à "total anarquia que impera em Portugal, a cair num domínio completo dos comunistas, e a que têm face a Espanha, um bastião contra a expansão comunista".
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