Sunday, May 18, 2008

O que Kissinger dizia de Portugal em 1975



Esta é a transcrição de uma conversa telefónica entre o secretário de Estado, Henry Kissinger, e o subsecretário de Estado para os Assuntos Europeus, Art Hartman, em 17 de Julho de 1975. Por essa altura, há muito tinha terminado a fase do "wait and see" e do cepticismo do homem forte do Departamento de Estado. Kissinger quer acção e está muito bem informado do que se passava nas ruas e nos corredores do poder. O objectivo de pôr o camarada Vasco na rua é claro e explícito! O texto foi publicado no DN e também está no livro. A fonte deste documento é o FOIA do Departamento de Estado.

Hartman Temos uma reunião do gabinete marcada para as 12:30. Quer reunir antes disso?
Kissinger OK, pode ser às 12:30. Mas, entretanto, podemos enviar uma mensagem a Carlucci [embaixador em Lisboa]: se ele quer trazer de Portugal um prémio de boas maneiras democráticas? E Costa Gomes compreende que se ele tomar a iniciativa nós apoiamos?

H Bom, ah...
K Sim ou não?
H Não sei dizer...
K Estamos a fazer alguma coisa quanto a esta crise ou estamos a pensar...no que fazer.
H Não, estamos a pensar dar o nosso apoio público.
K Mas o que estamos realmente a fazer?
H Não sei o que estamos a fazer. Ele [Carlucci] está a conversar com eles.
K Mas o que está ele a dizer?
H Ele diz que os elementos democráticos deveriam ser apoiados.
K Isso significa o quê?
H Significa apoiar Soares e o PPD, dar o poder aos oficiais moderados [do MFA] e pôr [o primeiro-ministro, Vasco] Gonçalves na rua. Mas ele [Carlucci] está a fazer as coisas calmamente com as pessoas com quem tem falado.
K E com quem tem ele falado?
H Ele teve uma conversa com [Melo] Antunes e com algumas pessoas do seu gabinete e...
K Para mim, Soares e o PPD são uma dor de cabeça. Eu quero que os moderados... vençam. (...)
K Espero que ele [Carlucci] esteja a fazer tudo ao seu alcance para Costa Gomes e [Melo] Antunes entenderem que nós os apoiamos no seu esforço para que ganhe o grupo dos moderados. (...)
H Há um perigo - é se eles devem livrar-se já de Gonçalves. A situação económica é muito má.
K Nós vamos ajudar.
H Sim, mas a situação é muito má e...
K Art... Se nos livrarmos de Gonçalves, eu depois resolvo esse problema.
H OK.
K Isso não me preocupa muito. Se nos livrarmos de Gonçalves e da sua equipa, deixe-me ser eu a preocupar-me com a situação económica. (...)
H Depois haverá cada vez menos ligações com os comunistas.
K É verdade. E se conseguirmos que os comunistas avancem, podemos esmagá-los.
H Bom, eles andam todos nas ruas.
K Quem? Os comunistas?
H Tanto os comunistas como os socialistas. [Otelo Saraiva de] Carvalho distanciou-se agora um pouco de [Vasco] Gonçalves. O que pode acabar por ser uma ajuda para os moderados. Mas eu acho que, a certa altura, ele vai querer poder.

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